A Eurocopa entre nacionalismo e crise
16/06/12 13:37Vocês acham que o futebol ajuda a amenizar momentos de crise de um país ou aliena a população dela?
Pensei nisso várias vezes nesta semana, quando a Espanha, em meio a resgate financeiro, títulos da dívida nas alturas e afins, teve um ótimo desempenho na estreia da Eurocopa, viu ressurgir um ídolo do futebol e ainda a vitória de seu principal tenista, Rafa Nadal, no torneio de Roland Garros. Esse bom momento no esporte reascendeu um nacionalismo por aqui que alguns setores já acham que desvia a população do momento de crise.
Não tenho muitas memórias da Copa de 1994, mas lembro bem dos discursos de que pelo menos o nosso futebol era um respingo de alegria para o “sofrido povo brasileiro”.
Algo similar acontece por aqui. Hoje, no jornal “El Mundo”, o colunista Frederico Jiménez Losantos escreve, com uma pitada de ironia, que “os pobres espanhóis, moídos e debilitados pela crise, tivemos pelo menos um motivo de satisfação”.
A última quinta-feira foi o ápice desse movimento: o país amanheceu com os títulos da dívida batendo recorde, a nota de risco rebaixada no limite do recomendável a investidores e o sinal de alerta do Banco Central Europeu a todo o continente europeu. Mas foi dormir celebrando a esmagadora vitória de sua seleção sobre a Irlanda por 4 a 0 pela Eurocopa, campeonato que o pessoal aqui leva quase tão a sério quanto a Copa do Mundo.
Na sexta-feira, um mar de bandeiras espanholas eram agitadas nas sacadas de prédios. Os jornais e noticiários de televisão pareciam passar apressados pelos informes econômicos para anunciar animados a vitória da seleção e o ressurgimento de um antigo ídolo, Fernando Torres, que enfrentava má fase desde a Copa do Mundo.
Autor de dois gols no jogo de quinta-feira, Torres era de novo herói nacional no dia seguinte. Já de manhã, uma foto sua gigante estampava o anúncio de um marca esportiva que cobre um dos principais prédios da Porta do Sol, a praça central de Madri, e ainda a capa dos seis principais jornais.
Este anúncio da Coca-cola veiculado logo depois do jogo em alguns canais de televisão ilustra o suspiro nacionalista: na propaganda, vários jornais com notícias sobre a crise na Espanha são sobrepostos uns aos outros, até que um torcedor os rasga em pedacinhos que são lançados sobre a torcida de um jogo da seleção.
Também como nos anos de ditadura militar no Brasil, no entanto, tem uma turma que não está gostando nada desse espasmo nacionalista provocado pelo bom desempenho do futebol espanhol. Em manifesto sobretudo nas redes sociais, esse movimento acha que não é hora de a população, que vê seus direitos, salários e benefícios reduzidos a cada semana, cantarolar “Yo soy español, español, español”.
A comemoração, dizem, desmobiliza a população para lutar contra os cortes de gasto pelo seu governo, às portas de um grande resgate financeiro.
Como já disse aqui, não sou especialista em futebol, mas esta semana ele se infiltrou no cenário econômico agonizante que o país vive. Para o bem ou para o mal. O que vocês acham?
Interessante o tema. E a alienação braba mesmo é a dos ricos que têm dinheiro e querem mais dinheiro. E qd não têm onde gastar começam a comprar “obra de arte” fake. Tenho um imbecil na família que já construiu pra mais de uma dúzia de residências pra deixá-las vazias. É um mundo bonito onde quem não precisa mais de dinheiro é justamente quem mais continua ganhando. E eles ainda acham que a gente os inveja, pq pensam que todos são assim como eles. Xá pra lá…
Respondendo à sua pergunta, para mim, a diferença entre amenizar e alienar é somente a dose. E no caso da Espanha, a crise é tao aparente, tao presente, que acho que nao se trata de dose suficiente para alienaçao.
Eu achei muito estranho em plena crise espanhola, ver tantos espanhois nas arquibancadas da Polonia assistindo os jogos de sua seleção. Essa tão falada crise não parece ser para todos.
Luisa, vc sabe explicar isso? Ou será que o futebol está acima da crise?
Neco, não há uma explicação fechada. A crise não atinge a todos da mesma maneira, obviamente. Pode ser que esses torcedores tenham cortado gastos de alguma maneira mas, ainda assim, ir à Eurocopa ainda cabe no orçamento deles, assim como outras viagens. Ainda que se diga por aqui que muitos espanhóis não estão poupando o suficiente para o caso de a situação piorar, a crise ainda não chegou ao ponto de que nenhum espanhol possa se permitir esses gastos extras. Restaurantes seguem cheios, as pessoas continuam viajando, indo ao cinema, comprando, etc, ainda que menos, e ainda que já haja famílias sem dinheiro suficiente para comprar comida.
abs.
Com ou sem crise no Brasil, sempre tem brasileiro nas arquibancadas dos maiores eventos mundiais. O efeito da crise não impede os mais privilegiados de continuar curtindo o status social.
a crise financeira nao afeta toda a populacao..