O resgate catalão
31/07/12 08:07BARCELONA
O pedido de resgate da região da Catalunha ao governo central da Espanha reascendeu chispas nacionalistas e aqui em Barcelona e no resto do país.
A Catalunha foi a terceira do país a solicitar ajuda do fundo de liquidez do governo central, um mecanismo que o premiê Mariano Rajoy acaba de criar para ajudar a sanear dívidas das regiões.
Como a Folha noticiou ontem, todas as regiões daqui da Espanha, chamadas de comunidades autônomas –similares aos Estados brasileiros só que com mais autonomia–, estão endividadas, e saná-las é imprescindível para combater a desconfiança dos mercados à Espanha como um todo. Por isso Rajoy criou o tal fundo de liquidez, dotado de 18 bilhões de euros (cerca de R$ 45 bilhões), ao qual Andalucia e Murcia, além da Catalunha, já recorreram.
A lógica é a mesma dos resgates que a União Europeia já fez a países como Grécia e Portugal: o governo central empresta dinheiro para sanar as dívidas das comunidades autônomas, mas exige contrapartidas.
Nesta terça-feira, uma reunião do conselho fiscal vai definir essas condições. O que já é certo é a meta de 0,7% de deficit para essas regiões em 2013 e de superavit para 2014, ambos fixados pela União Europeia. Pelo cenário atual, no entanto, vai ser difícil chegar lá: a região com melhor desempenho fiscal, Madrid, fechou 2011 com deficit de 1,13%. Já a pior, Castilla-La Mancha, está na casa dos 7,3%. E a Catalunha acumula hoje 3,72%.
A diferença do pedido de resgate do governo catalão para as outras comunidades autônomas é que, tradicionalmente, a região é a mais próspera da Espanha. Uma imagem que o governo local tem tido cada vez mais dificuldades para manter.
A região acumula dívida de € 42 bilhões (cerca de R$ 105 bilhões). Ontem, depois de meses anunciando cortes de gastos, o governo catalão anunciou que não poderá pagar convênios de mais de 400 milhões de euros (cerca de R$ 1 bilhão) que mantém com hospitais, colégios e entidades de serviço social da região neste mês.
No meio dos números vermelhos, a Catalunha discute sua autonomia fiscal. Na semana passada, o parlamento catalão aprovou um novo pacto fiscal para a região, que, entre outras medidas, pede uma Fazenda própria para a região. Ou seja, os impostos catalães ficariam retidos lá dentro, assim como sua aplicação, sem chegar ao governo central.
O argumento histórico da Catalunha para isso é que a região sempre gerou muito mais recursos ao Estado do que recebeu de volta. Em sessão no parlamento catalão, Artur Mas, o presidente da região, defendeu este ponto de vista.
Durante todo o dia, o assunto tomou mesas de bares em Barcelona, com opiniões bem divididas. Um discurso, no entanto, foi quase unânime: na Catalunha sempre se trabalhou mais que no resto da Espanha em geral, e por isso não é justo que agora a região arque com a má gestão dos vizinhos. No contra-argumento, se critica os últimos governos catalães justamente por não controlar gastos e acumular deficit.
No resto da Espanha, o pacto fiscal da Catalunha não desceu bem e reascendeu as críticas ao nacionalismo catalão. Nos principais jornais, o tom também foi de crítica. A mais escancarada delas saiu no “ABC”, jornal com mais tendência monarquista, que ontem acusou a Catalunha de ser a região que mais consome verba para serviços de saúde. No domingo, o “El País” contou como a imagem de “rica e empreendedora” da Catalunha está sendo levada embora junto com a crise espanhola e, mais ainda, com o pedido de resgate pela região.