Cozinha da Espanha de volta ao topo
30/04/13 23:03LONDRES
Depois de uma semana de notícias tão indigestas quanto recorde de desemprego e de déficit e goleadas históricas no futebol, a coroação de um restaurante espanhol como o novo número um do mundo na segunda-feira caiu muito bem ao estômago da Espanha.
Como a Folha noticiou nesta terça-feira, o restaurante Celler de Can Roca, que fica na Catalunha, foi eleito pela primeira vez o melhor do mundo em uma lista considerada o “Oscar” da gastronomia mundial e anunciada na noite de segunda-feira em Londres.
O ranking, da revista inglesa Restaurant, é elaborado anualmente por um juri composto por 900 pessoas, entre chefs, críticos e personalidades da gastronomia. O resultado é anunciado sempre em abril em uma cerimônia na capital inglesa que vim acompanhar pelo terceiro ano.
Desde então, a Espanha nunca havia reconquistado o posto máximo. Desta vez, o espanhol Celler desbancou o dinamarquês Noma, que era eleito o número um desde 2010. O curioso é que o Noma havia tirado o posto justamente de outro espanhol, o El Bulli, de Ferran Adrià, o chef catalão que revolucionou a gastronomia de todo o mundo.
A volta da coroa para a Espanha foi bastante celebrada no país. Todos os jornais e noticiários televisivos destacaram a eleição dos irmãos Joan, Josep e Jordi Roca, que comandam o Celler. Editorias destacaram a volta da Espanha ao topo da lista como o símbolo de uma suposta atenção exagerada aos índices econômicos do país e reações do mercado a eles.
E é realmente só simbólico relacionar a eleição do Celler à volta ao topo da gastronomia espanhola. Porque a gastronomia espanhola nunca saiu do topo desde Ferran Adrià. No exclusivo “top 10” da lista da Restaurant, há três espanhóis –e nenhum francês, para uma base de comparação com a que era a cozinha de referência até a década passada. Os irmãos Roca figuravam há dois anos no segundo lugar da lista, seguidos dos bascos Mugaritz e Arzak.
Mesmo assim, foi inevitável aos quatro chefs espanhóis presentes na cerimônia com quem conversei –Juan Mari Arzak, Quique da Costa, Andoni Arduriz, todos na lista dos 50 melhores chefs do mundo– evocar a crise e os momentos difíceis pelos quais seu país está passando.
“Não gostaria tanto de reivindicar uma espécie de nacionalismo culinário, porque muitos dos restaurantes que estão nesta lista compartem os mesmo valores. Mas isso [a Espanha de volta ao topo] vai conseguir uma mirada importante ao nosso país e, no fundo, isso nos beneficia a todos os espanhóis e vem fantasticamente bem para a Espanha, que é uma potência turística e exporta um estilo de vida”, disse o basco Andoni Arduriz, do Mugaritz, neste ano eleito o quarto melhor do mundo.
A alta gastronomia espanhola já vem conseguindo passar com certa imunidade pela crise econômica. Como contei neste post ano passado, nenhuma das casas mais estreladas do país fechou as portas até agora, enquanto que, desde 2008, a Espanha já perdeu mais de 12 mil bares e restaurantes.
E isso mesmo com menus que chegam a custar € 180 euros (cerca de R$ 470), sem bebida.
O que os mantém de pé –e sem sinal de cair–, é em boa parte o reconhecimento internacional. A Espanha dita as bases da gastronomia mundial há uma década, e por isso os representantes máximos deste movimento atraem muita gente ao país.
No campeão Celler de Can Roca, por exemplo, nada menos dois mil pedidos de reserva chegaram ao email do restaurante apenas no dia seguinte à sua coroação em Londres. Mesmo antes disso, a fila de espera já chegava a um ano.
Em tempo, já que estamos em um espaço para assuntos ibéricos: apenas um português aparece na lista dos melhores chefs do mundo. É o Vila Joya, em Albufeira, que apareceu ano passado no ranking e este ano subiu oito posições, para o 37º lugar.
Muy Bueno, chicos!