Santiago sorri em silêncio
30/07/13 16:17SANTIAGO DE COMPOSTELA
Um silêncio como poucos que ouvi na vida tomava conta da catedral de Santiago no domingo, apesar da multidão que lotou a igreja e fazia fila para entrar ali.
Era para ser uma missa alegre, o ápice das festas de Santiago, patrono da Espanha e cujo o dia, 25 de julho, é celebrado com festa de uma semana nas ruas da cidade galega. Seria assim este ano, não fosse na véspera o descarrilamento de um trem a quatro quilômetros da estação de Santiago, que deixou 79 mortos.
Por isso, no domingo havia um silêncio não só na catedral, quando o arcebispo lançava ao ar um incensório, o maior do mundo, momento que tradicionalmente simboliza alegria. “Hoje o faremos em homenagem a este momento”, avisou o arcebispo. Curiosamente, é também na catedral de Santiago que está a primeira pintura com um sorriso da arte românica, retratado no apóstolo Daniel.
Não foi muito difícil ver sorrisos nesses últimos três dias que passei em Santiago. Até porque a cidade é o destino final dos peregrinos do Caminho de Santiago, que normalmente celebram bastante quando chegam na praça da catedral e terminam a peregrinação.
Mas o clima é mesmo de silêncio. Não de revolta, nem tanto de luto, mas de silêncio, incompreensão.
Encontrei aqui algo muito parecido com o que vi em Oslo há dois anos, quando o extremista norueguês Andres Breivik abriu fogo no centro da cidade e em um acampamento de jovens socialistas, deixando 77 mortos. Ali o silêncio era também a tônica.
Em Santiago, a diferença é que a maioria dos mortos _79_ não era daqui. Os poucos que eram, como o brasileiro Fabio Cundines Antelo, 25, são lembrados por quase todos com quem eu converso. O jornaleiro me conta que sua filha era amiga de Antelo. Jovens na porta de um cinema dizem que ele lhes ensinou hip hop, uma de suas paixões segundo amigos seus.
Mas a sensação dos moradores é que eles foram atropelados pelo fato de o trem ter descarrilado e colidido na entrada de sua cidade. Ainda mais no povoado de Angrois, justo em frente de onde o trem descarrilou.
Os moradores de Angrois, que tem cerca de 40 casas, desceram aos trilhos para socorrer as vítimas antes de o socorro chegar _e por isso receberam visita dos príncipes da Espanha e serão homenageados com a medalha de honra ao mérito da prefeitura de Santiago.
Um deles é o um jovem de 15 anos, filho do taxista José Gutiérrez, que me levou ao povoado. Ele virou um dos rostos mais conhecidos na imprensa espanhola nesses dias porque foi um dos primeiros a entrar nos vagões e, ignorando as imagens que via, ajudar os passageiros.
“Não vamos sair daqui, mas vai ser difícil superar”, disse Gutiérrez.
No hotel em que me hospedei e na loja de souvenir, as funcionárias me contam o desapontamento em ter a festa cancelada, uma das principais celebrações religiosas da Espanha.”Mas não é nada perto do que aconteceu”, disse a gerente do meu hotel.
Mesmo assim, não foi difícil receber sorrisos na cidade…
que relato bonito, Luisa!
parabéns!