Destruição a toda costa
09/08/13 06:35Sempre que vou à costa mediterrânea da Espanha, algo mais comum agora no verão, vejo da estrada uma série de edifícios em construção no meio de povoados isolados. São heranças que o boom do mercado imobiliário deixou pelo caminho depois de ser arrasado pela crise financeira. Nos anos dourados desse mercado, entre o fim da década de 1990 e o início dos anos 2000, leis permissivas combinadas ao crédito fácil levaram o dinheiro do país à sua costa. Quando a crise chegou e o financiamento secou, muitas construções acabaram ficando pela metade, ao mesmo tempo que já abandonadas.
Retomo o tema não só por causa do verão –cujos frequentes 40ºC expelem a população aqui de Madri em direção às praias do país– mas por uma pesquisa, feita com base em imagens de satélites, que a ONG Greenpeace divulgou nesta quinta-feira. Segundo o estudo, só entre 1987 e 2005 o mercado imobiliário engoliu nada menos que 23% de toda a costa espanhola, que não é pequena –são cerca de 7.800km banhados pelo mar, pouco mais que o litoral brasileiro.
O avanço imobiliário sobre uma costa até pouco tempo atrás caracterizada quase exclusivamente por pequenos povoados e oliveiras não é novidade. O próprio Greenpeace realiza anualmente esse estudo, chamado de “Destruição a toda costa”, um jogo de palavras que denuncia a crítica da ONG ao governo espanhol. Este ano, porém, impressionou a proporção de solo próximo ao mar –quase a quarta parte– consumido por esse mercado em tão pouco tempo –18 anos. Se continuasse assim, alertou a ONG, a Espanha teria todos os metros quadrados da costa ocupados em pouco mais de 100 anos.
Neste ponto, a crise econômica agiu de forma positiva, porque pôs o freio automático a um mercado cuja velocidade a flexibilização da legislação espanhola ajudou a acelerar. Atualmente, o Congresso espanhol debate a reforma da Lei de Costas, que colocou ambientalistas e povoados mediterrâneos em pé de guerra com o governo de Mariano Rajoy. Isso porque o novo texto prevê a anistia a uma série de construções irregulares da costa. O próprio Greenpeace lançou esta campanha apenas para tentar derrubar o texto.
O foco da campanha é a costa mediterrânea, a mais afetada pelo mercado imobiliário segundo o estudo –a mais protegida é a de Astúrias, na costa cantábrica, enquanto que Ibiza, a meca do verão espanhol, é onde a destruição avança mais rapidamente.
Foi lá no Mediterrâneo, na altura de Alicante, que vi há cerca de dois meses este edifício gigantesco, ao lado de um extenso campo de oliveiras e de um grupo de casas. Apesar de parecer em construção, o prédio, projetado para ser um grande complexo de apartamentos de veraneio, está abandonado há mais de três anos:
Me lembrei da Torre de Babel…
ganância desenfreada, pena!