Na carona do post de ontem, prolongo para hoje o tema dos imigrantes. Peço desculpas pela repetição, que faço não por falta de assunto –afinal, assunto não tem faltado na Espanha!– mas por duas pesquisas divulgadas nesta terça-feira aqui em Madri sobre imigração.
As duas, uma da Comissão Europeia e outra do governo da capital espanhola, chegam mais ou menos à mesma conclusão, ainda que a partir de métodos e dados bem distintos: o imigrante na Espanha tem nível superior, já chegou aqui com visto de trabalho e está trabalhando apesar da crise. Em alguns grupos étnicos, como os chineses, chega ao pleno emprego.
Como muitas pesquisas, se trata de uma generalização. Especialmente no caso do estudo da Comissão Europeia, o “Immigrant Citizens Survey”, que entrevistou entre 300 e 600 estrangeiros residentes legais de 15 cidades europeias, como Madri, Barcelona, Berlim, Lisboa, Nápoles e Bruxelas.
Dessas entrevistas, tirou conclusões que contrastam com a impressão que se tem por aqui da maioria dos imigrantes: mais de 60% dos entrevistados têm nível universitário. Em Barcelona, o índice chega a 70%.
A maioria deles, diz a pesquisa, não aterrissou na Europa de forma ilegal, mas com uma autorização para trabalhar em mãos. Hoje, vive com o visto de residência legal, depois de esperar uma média de cinco anos.
A Espanha, cujo boom do mercado imobiliário demandava e absorvia muita mão de obra estrangeira na década passada, teve a maior porcentagem dos que chegaram com visto de trabalho: quase 60% em Madri. Já o índice de imigrantes irregulares na capital espanhola foi de 30%, o menor entre os países do sul da Europa.
Apesar de o instituto de estatísticas espanhol situar a população imigrante como a mais afetada pelo desemprego no país, a maioria dos entrevistados na pesquisa da CE em todas as cidades europeias disse continuar trabalhando mesmo com a crise.
Em Madri, mais da metade dos imigrantes, 56%, está trabalhando nestes tempos de crise. No caso dos chineses, este índice chega ao impressionante 95%. Ou seja, pleno emprego.
E isso quem diz não é a Comissão Europeia, mas o governo de Madri, em um perfil bem mais amplo dos imigrantes que vivem na região, também divulgado nesta terça-feira. Feita com 3.000 estrangeiros residentes em Madri, essa pesquisa conclui também que a capital espanhola virou um refúgio da crise para imigrantes que viviam em outras cidades espanholas. Este índice foi de 20%, sete pontos percentuais acima da última pesquisa, feita em 2009.
Embora a maioria esteja trabalhando, o índice de desemprego deles, 34,6%, é mais alto que o da média espanhola, de 24%. A grande diferença, segundo analisa a publicação, é que quase todos os imigrantes, nove de cada 10, trabalha de forma autônoma, o que cria uma impressão virtual de que estão mais empregados que os cidadãos nacionais. A pesquisa da Comissão Europeia também aponta que a maioria dos imigrantes das 15 cidades estudadas é empregada no setor privado.
O caso dos chineses é exceção do desemprego. Aqui em Madri, eles vivem em uma espécie de bolha laboral. A grande maioria, 95% segundo a pesquisa, tem emprego porque já chega aqui contratada por conglomerados de compatriotas, que têm atividades comerciais espalhadas pela cidade.
Quer um exemplo? Quando você estiver passeando por Madri e quiser comprar um refrigerante na rua, coloque a cara na primeira lojinha de conveniências que achar e veja se lá dentro não estará uma família chinesa atrás do balcão. Perceba também como, em lojas de roupas bem baratinhas as vendedoras não aparentam ser todas das China –em muitos casos, nem sequer falam espanhol e só se comunicam em chinês com as colegas de trabalho.
Mesmo com trabalho, documentação legal e nacionalidade do país para o qual migrou, no entanto, a maioria dos imigrantes ouvidos pelo estudo da Comissão Europeia relatou não se sentir integrado às cidades em que vive.
Aqui na Espanha, isso ainda não é motivo de conflito com a população local, que em geral aceita bem a presença de estrangeiros. Mas os maiores choques sociais devem vir nos próximos anos, quando a segunda geração –ou seja, filhos dos imigrantes–, chegarão ao mercado de trabalho. “Historicamente, esse é um momento de conflito nos países da Europa. Aqui na Espanha, já há bandas latinas que cometem delinquências em Madri e Barcelona”, disse o sociólogo Lorenzo Cachón, da Universidade Complutense de Madri, que comentou a pesquisa da CE durante seu lançamento nesta terça-feira.