Cidade fantasma
19/08/13 15:44Quem vem visitar Madri em agosto costuma se assustar não só com o calor, mas também com ruas vazias e comércios fechados. Fecham lojas –cada vez menos, há que se dizer–, restaurantes, escritórios, academias, bibliotecas, e a capital espanhola vira uma espécie de cidade fantasma neste mês, uma sensação que eu também não escapo de sentir mesmo de cinco verões madrilenhos nas costas.
Neste sábado voltei a ter essa sensação quando buscava um restaurante aberto no calor de quase 40ºC ao chegar de viagem. É que com essa temperatura nas alturas e nenhuma praia a menos de três horas de distância em carro, Madri praticamente hiberna no verão. Muita gente tira férias neste mês e quem segue trabalhando arruma um jeito de viajar nos fins de semana.
É uma espécie de acordo mútuo, um ciclo que não se sabe aonde começou: com os clientes de férias, a loja de frutas da esquina fecha as portas por 15 dias. Sem frutas e sem clientes, o restaurante também sai de férias, assim como o escritório vizinho. E quem vai querer comprar roupas assim?
E a esta altura você já deve estar se perguntando como que a capital de um país em crise e com carência de produtividade e consumo se permite o “luxo” de parar por quase um mês.
Eu também me pergunto, assim como muita gente aqui, mas há vários poréns neste enredo. Em primeiro lugar, é preciso dizer que nem todo mundo sai de férias, e nem todas as lojas fecham –nas zonas turísticas, são muito poucas até. E quem fecha o faz por 15 ou 20 dias em média. Parece muito? Pois todos os anos ouço de algum madrilenho, a maioria idosos, que “antigamente, tudo se fechava o mês inteiro”.
Essa espécie de saudosismo alimenta um debate que se repete a cada verão, sobre se esse hábito é um luxo inviável em tempos de crise ou uma tradição que preza a qualidade de vida no lugar do incentivo ao consumo e ao trabalho excessivos.
Além disso, as portas fechadas no verão não são exclusividade espanhola. Até Paris, com temperaturas bem mais amenas que a vizinha espanhola, também tem parte do comércio interrompido ao longo da estação. Um amigo que vive lá me contou que até uma das melhores sorveterias da cidade sai de férias justo na estação em que poderia vender mais seus produtos.
Por aqui ainda não soube de alguma sorveteria que feche justo quando mais deveria estar refrescando gargantas secas pelo verão quase sem umidade daqui. Mas não há um bairro por aqui em que não se tope com a placa “cerrado por vacaciones (fechado por férias)” na porta de algum comércio.