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Luisa Belchior

Diário Ibérico

Perfil Luisa Belchior é correspondente-colaboradora em Madri

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Camp Nou soberanista

Por Luisa Belchior
28/06/13 21:43

O independentismo catalão é um tema que resiste à crise, denúncias de corrupção, futebol e tantos outros assuntos que ocupam a pauta da Espanha nesses tempos.

Volta e meia ele reaparece com demonstrações de força. O último grande espasmo foi em setembro do ano passado, quando, como contei neste post, 1,5 milhão de pessoas foram às ruas em Barcelona pelo celebrar a Diada, data que relembra a batalha de Barcelona com tropas da monarquia espanhola no século 18 e que virou símbolo do orgulho catalão.

Hoje, 90 mil pessoas lotaram o Camp Nou, o estádio do Barcelona, para um show em favor do projeto soberanista da região.

Na arquibancada, torcedores formaram a palavra “freedom” (liberdade), a partir de um jogo de cores, e gritaram independência. Vejam neste vídeo reproduzido pelo site do jornal “El País”.

 

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Primeira prisão do 'mensalão espanhol'

Por Luisa Belchior
27/06/13 21:04

A Espanha não vive a onda de manifestações do Brasil, mas também mandou político para a cadeia hoje, como fez ontem o STF (Supremo Tribunal Federal) brasileiro ao decretar a prisão do deputado Natan Donadon (PMDB).

No fim da tarde aqui na Espanha, a Justiça do país ordenou prender o ex-tesoureiro do PP (Partido Popular) Luis Bárcenas, suspeito de ser o operador de um suposto esquema de financiamento ilegal, conhecido aí no Brasil como o “mensalão espanhol”.

Ao contrário do deputado Donadon, que já havia sido condenado pela Justiça em 2010 a 13 anos de prisão por desvios na Assembleia de Rondônia, o caso de Bárcenas ainda está em investigação.

Mas o juiz responsável pelo caso achou que havia risco de fuga do ex-tesoureiro e determinou sua prisão de forma incondicional e sem fiança.

Embora o suposto mensalão espanhol envolva até o atual premiê espanhol, Mariano Rajoy, foi o nome de Luis Bárcenas o que ficou mais atrelado ao caso. Segundo a denúncia, que está na Justiça, Bárcenas operava doações irregulares e não declaradas que grandes empresas faziam ao PP em troca de benefícios como concessão de obras e serviços públicos.

O caso veio à tona quando o jornal “El País” publicou a suposta lista de doações com os nomes dos supostos beneficiados no partido, entre eles Rajoy e o ex-premiê José María Aznar. Bárcenas, segundo a acusação, era o responsável por receber as doações e distribuí-las a dirigentes do partido, através de contas na Suíça que a Justiça já certificou que ele tem.

Hoje, o ex-tesoureiro entrou na Audiência Nacional para mais um depoimento e saiu de lá direto para o presídio de Soto del Real, aqui em Madri. Sua defesa vai recorrer e afirma que ele está sendo usado como bode expiatório no caso, que envolve nomes muito mais importantes que o de Bárcenas.

A prisão ocorre em um momento em que uma série de denúncias de corrupção em várias instâncias do governo espanhol estão vindo à tona. E, embora não vivam a mesma onda de manifestações que o Brasil, os espanhóis também andam mostrando saturação com um tema comum a ambos os países: a corrupção.

 

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A princesa, o ministro e o fisco

Por Luisa Belchior
26/06/13 20:05

Uma trapalhada do Ministério de Fazenda espanhol fez recair sobre a família real uma nova suposta irregularidade.

Há algumas semanas, a Justiça espanhola recebeu informações da Agência Tributária de que a infanta Cristina, filha mais nova do rei Juan Carlos 1º, participou de uma operação de venda ilegal de propriedades na Espanha.

Segundo o órgão, a infanta Cristina vendeu sem declarar, em 2005 e 2006, propriedades em Barcelona, Alicante e Ciudad Real, por cerca de € 1,4 milhão (R$ 4 milhões) no total. A filha do rei logo tratou de negar a acusação e, por meio de seu porta-voz, afirmou que deveria se tratar de um erro dos agentes.

Poucos dias depois, o ministro da Fazenda, Cristóbal Montoro, disse que de fato houve o tal o erro, atribuído por ele aos funcionários da Agência Tributária, que teriam confundido o número de identidade da infanta Cristina. Montoro tratou de pedir desculpas públicas à família real, e o caso parecia resolvido.

Até que, hoje, os agentes tributários resolveram colocar a boca no trombone. Afirmaram à imprensa que não se equivocaram e insistiram que o número de identidade encontrado na operação de venda das propriedades é, sim, o da infanta Cristina.

Com a retificação, o grupo de funcionários abriu uma guerra velada com o ministro de Fazenda, que lhes atribuía o erro. Eles desmentiram o ministro, que voltou a culpá-los pelo suposto erro, deixando a bola no ar.

A outra filha do rei, infanta Elena, já foi erroneamente multada por conduzir um trator fora de uma área rural. Descobriu-se depois que a infanta jamais havia conduzido um trator, e seu número de identidade havia sido confundido com o do real infrator.

Desta vez, insistem os agentes, não há erro. A infanta Elena, que já é investigada na Justiça por suposta  participação em um também suposto esquema de desvio de verbas públicas de seu marido, Iñaki Urdangarín, comando a operação das propriedades. Desse trator, afirmam, ela estava na direção.

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A 'farra' da seleção espanhola

Por Luisa Belchior
25/06/13 20:53

Não caiu nada bem por aqui a notícia difundida no Brasil de que a jogadores da seleção espanhola estão fazendo festa e tentaram contratar prostitutas no Recife, onde disputarão a semi-final da Copa das Confederações.

A fama dos jogadores da “Roja” costuma ser bem boa por aqui. A maioria é casada e com filhos, uma imagem que a imprensa local gosta de ressaltar.

Hoje, ao longo do dia, a imprensa espanhola fez coro ao jogador Sérgio Ramos, que acusou o responsável pela notícia de mentir durante entrevista coletiva no Brasil. Por aqui, o tom foi de conciliação, mas com bastante reservas à acusação contra os jogadores espanhóis.

A TVE (Televisão Espanhola), normalmente mais contida, chamou o assunto de sensacionalista e falou em mentira também, nesta reportagem.

 

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Mão solta do fisco

Por Luisa Belchior
24/06/13 18:59

Há quem diga que é por mídia, mas o fato é que neste ano o fisco espanhol tem investido na perseguição a personalidades do país com supostos delitos de fraude fiscal.

Há algumas semanas foi o argentino Lionel Messi, estrela do Barcelona e atual melhor jogador do mundo. Uma investigação da Promotoria catalã encontrou um suposto esquema de evasão fiscal de mais de € 4 milhões (cerca de R$ 11,4 milhões) cometido por Messi e seu pai, em um caso que já está na Justiça.

Hoje, foi a vez de Sergi Arola, um dos chefs de cozinha mais famoso da Espanha, virar alvo do fisco.

Arola é também uma das personalidades mais midiáticas do mundo da gastronomia espanhola, que não é pequeno. Participou de programas de televisão e revolucionou a cena gastronômica aqui em Madri, onde passou por alguns restaurantes de peso até abrir o seu próprio em 2008, hoje condecorado com duas estrelas Michelin.

Foi lá que hoje, bem na hora do almoço, agentes da Fazenda espanhola entraram, interditaram mesas e o bar e entregaram uma carta notificando uma dívida do restaurante com o governo de € 150 mil (cerca de R$ 435 mil).

O chef, que estava em Paris no momento, acusou o governo de usá-lo como bode expiatório, em entrevista por telefone à uma rede de televisão espanhola. Ele acha que o fisco quer promover suas ações, escolhendo famosos como alvo.

Arola alegou que já estava quitando a dívida e queixou-se dos prejuízos que a interdição de seu restaurante, que ficará fechado por tempo indefinido, lhe trará.

A Espanha vem sendo cobrada por seus sócios europeus a ter o pulso mais firme na perseguição de casos de fraude e evasão fiscal, que segundo a União Europeia gera prejuízos na casa do € 1 trilhão (R$ 2,91 trilhões) anuais em todo o bloco.

No mês passado, os líderes dos 27 países da UE se reuniram em Bruxelas para discutir soluções a esses casos. Pactaram um intercâmbio de dados fiscais para coibir o envio de dinheiro não declarado a paraísos fiscais.

 

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Protestos, de bengala

Por Luisa Belchior
24/06/13 18:55

Três vezes por semana, a aposentada Elvira González, 67, tem um compromisso inadiável: ir às ruas protestar. Há um ano, todas as terças, quintas e sábado, ela e o marido pegam o apito e o cartaz e vão à luta.

Os dois fazem parte de um movimento de idosos espanhóis, a maioria aposentados, que teve suas poupanças transformadas em ações por seus bancos na época do boom imobiliário da Espanha. Agora, depois de descobrir que viraram acionistas com as economias da vida inteira, lutam na rua e na Justiça para reaver o dinheiro.

Eu conheci a Elvira e seu marido na semana passada, durante um desses protestos aqui no centro de Madri. E voltei a lembrar dela hoje, ao saber da vitória de dois desses casos na Justiça espanhola.

Em um deles, os Juizados de primeira instância de Daimiel, em Castilha-La Mancha, e Alcorcón, município de Madri, condenaram o Bankia, a entidade financeira que é o foco do protesto dos aposentados, a devolver, respectivamente, € 246 mil (cerca de R$ 720 mil) e € 45 mil (cerca de R$ 132 mil) a aposentados que, segundo a Justiça, não tinham conhecimentos financeiros suficientes para adquirir ações preferencias nas quais suas poupanças foram transformadas.

Esta é a principal reivindicação deste movimento. Eles alegam terem sido enganados por funcionários dos bancos que lhes ofereceram o investimento sem informar que se tratava de uma ação de risco. Assinando a operação, eles transformaram suas economias em ações que, hoje, valem até menos do que tinham, caso dos títulos do Bankia.

Ano passado, vários bancos reconheceram ter errado ao oferecer produtos de alto risco a clientes ordinários como foram esses casos.

Embora tentem reaver seu dinheiro na Justiça, os aposentados pedem, no protesto, uma mudança legislativa que impeça os bancos de fazer a operação e os obrigue a transformar suas ações em poupança novamente.

De todas as muitas manifestações que tomam as ruas da Espanha há mais de dois anos, este é um dos que mais me chama a atenção. Principalmente pelo público manifestante, via de regra 100% formado por idosos, alguns de bengala, como este senhor que encontrei em protesto na semana passada no centro de Madri:

Como eles, cerca de 1 milhão de famílias em toda a Espanha tiveram suas poupanças transformadas em ações das entidades financeiras desde 2007, segundo estima a Adicae (Associação de Usuários de Bancos, Caixas e Seguros da Espanha).

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Os 'indignados brasileiros'

Por Luisa Belchior
19/06/13 21:33

Desde que cheguei à Espanha, há quatro anos e meio, Brasil é uma etiqueta que agrega valor a qualquer assunto. Raramente ouvi ou li alguém falando mal do país. Pelo contrário: colegas elogiam nossa situação econômica, professores explicam a ascensão da classe C, conhecidos pedem dicas de trabalho no Brasil, amigos questionam por que troquei meu país em um de seus melhores momentos pela Espanha em um dos seus piores.

Só que, mesmo com os elogios, o nosso país nunca havia atraído tanta atenção como agora, desde que protestos tomaram as principais cidades brasileiras e colocaram à vista da Europa problemas e reivindicações até então pouco conhecidos por aqui. É como se o tema Brasil estivesse sempre rondando, bem falado, desejado, mas ainda como coadjuvante. Jamais havia visto, nestes quatro anos, o Brasil na manchete de um jornal daqui, por exemplo.

Até hoje.

Nesta noite, a principal notícia de todos os principais sites informativos aqui da Espanha é a suspensão do aumento das passagens de transporte público em São Paulo e Rio de Janeiro. “El País“, “El Mundo” e “ABC” dão destaque absoluto ao anúncio de ambos os governos, “Público” e “La Razón” destacam logo abaixo.

A Espanha acompanha com particular interesse a formação e evolução dos “indignados brasileiros”, como a imprensa local vem chamando a onda de protestos no Brasil. Isso porque o país ibérico tem atualmente cerca de € 85 bilhões em investimentos em solo brasileiro, segundo Câmara de Comércio Brasil-Espanha. Todas as empresas do Ibex 35, o principal índice da Bolsa de Madri, estão hoje no Brasil. E em uma pesquisa do Instituto de Empresas daqui 87% dos empresários entrevistados disseram ter investimentos ou planos de investir em nosso país. E sem falar que o governo espanhol faz forte lobby para abocanhar a licitação do trem de alta velocidade entre Rio e São Paulo.

Desde a semana passada, os protestos das duas capitais são destaque em todos os cinco principais jornais e os noticiários da televisão aberta. No fim de semana, fotos das manifestações brasileiras foram a imagem central da edição impressa do “El País”.

Em seus noticiários da tarde de hoje, a TVE falava de “protestos cidadãos” no Brasil, que criticam os gastos com a Copa do Mundo, mas também de saques a lojas ontem em São Paulo. E o canal “Sexta” afirmou que, apesar de manifestações ocupando já todas as principais cidades do país, “a revolução dos indignados brasileiros ainda está por chegar”.

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O que há em comum entre Madri e SP?

Por Luisa Belchior
13/06/13 18:19

Madri, São Paulo, Rio, Istambul, Londres, Tunísia,…

Uma multidão de jovens sai às ruas para protestar por seus direitos. Uma minoria parte para ações violentas. O ato termina em confronto com a polícia, bombas de gás lacrimogêneo, balas de borracha, barricadas, fogo. Jornalistas são presos e feridos. Uma opinião pública local condena. A internacional apoia.

Este enredo, que São Paulo e Rio vivem nesta semana por conta das manifestações contra o aumento das tarifas de transporte público, é exatamente o mesmo –salvo algumas nuances e reivindicações– dos que as ruas da Espanha experimentam há cerca de três anos.

É mais ou menos este o tempo que os espanhóis começaram a ir em massa às ruas em resposta à política de austeridade do governo do país. Desde então, aqui em Madri há ao menos uma manifestação a cada semana. Por isso, o meu olhar já viciado a essas cenas custaram a prestar atenção às imagens de protestos que a televisão espanhola emitia na noite de terça-feira.

A surpresa foi perceber que elas aconteciam na avenida Paulista e no centro do Rio, solo brasileiro, pouco dado a manifestações. Fora isso, tudo é muito similar ao que ocorre aqui na Espanha, do desenlace –uma avalanche de opiniões contrárias e favoráveis na mídia e nas redes sociais– às causas.

E digo que as causas são similares porque ambas começaram com reivindicações mais específicas para terminar –o que parece estar acontecendo no Brasil– com uma revolta contra uma situação mais macro no país –no caso da Espanha, os duros cortes de gastos sociais; no Brasil, o aumento do custo de vida que não acompanha uma melhora nos serviços.

Porque protestar contra R$ 0,20 a mais no preço do ônibus pode parecer pouco, mas por aqui, e até nas manifestações que eclodiram na Primavera Árabe, não foi por muito mais que as pessoas saíram às ruas.

Em Madri, o que levou à formação do chamado movimento dos indignados, que tomou as praças do país e exportou a ideia ao mundo, foi o fato de que policiais impediram umas dez pessoas de passar a noite na Porta do Sol uma semana antes de eleições internas no país.

Em 2010, o jovem que ateou fogo ao próprio corpo na Tunísia, dando início a protestos que eclodiram na Primavera Árabe, não era um revolucionário que exigia a queda de uma série de regimes ditatoriais, mas um feirante que protestava contra a repressão da polícia local a que vendesse seus produtos.

Todos desencadearam grandes manifestações com duros confrontos com suas respectivas forças policiais. Aqui na Espanha, invariavelmente, os protestos terminam assim, seguidos de barricadas e vidraças quebradas em alguns casos.

Não é raro também que jornalistas cobrindo o ato sejam agredidos ou presos, como aconteceu na avenida Paulista. Em 2010, logo após um dos primeiros grandes protestos em Madri, a imprensa divulgou o relato de uma repórter que, confundida com um manifestante, foi detida e passou a noite na prisão depois de, segundo ela, ser agredida.

Em Barcelona, está na Justiça o caso de uma jornalista que perdeu um dos olhos após ser atingida por uma bala de borracha disparada, segundo ela, por homens da polícia da Catalunha. Ontem, situação bem parecida aconteceu com uma repórter da Folha e um fotógrafo que, como sua colega espanhola, corre o risco de perder a visão. 

Em Madri, a recorrência dos protestos levou a imprensa a se organizar neles. Depois desses episódios, começamos a usar coletes com identificação, para que a polícia tivesse claro quem ali é da imprensa. Durante os primeiros protestos, em plena Porta do Sol, eu presenciei, bem na minha frente, um policial agredindo com cacetete um colega, que, como eu e todos ali, não estava  identificado.

E há também na Espanha visões bem opostas e acusações mútuas, como tenho visto nas redes sociais e artigos de opiniões do Brasil. Por aqui, empresários, comerciantes e políticos acham que os protestos daqui já passaram dos limites democráticos e caminham para ser cada vez mais violentos e coercitivos –em alguns casos, manifestantes perseguem políticos até a porta de sua casa. Já os movimentos sociais acusam o Estado e a polícia de coibir com violência manifestações democráticas, uma posição que já ganhou até apoio da União Europeia. A Anistia Internacional também condenou o “uso excessivo da força” nos protestos da Espanha.

A imprensa daqui tem se mostrado simpática aos movimentos nas ruas do Rio e de São Paulo. O “ABC”, de viés conservador e normalmente contrário aos protestos espanhóis, já noticiou hoje que “a polícia reprimiu violentamente os manifestantes”, em reportagem intitulada “A violência policial contra os manifestantes em São Paulo será investigada”. Nela destaca também que sua correspondente no Brasil “foi intimidada sucessivas vezes por policiais com balas de borracha”.

O “El Mundo” conta nesta notícia que os protestos são “a gota d´água” para o encarecimento e a piora de qualidade de vida no país, nas palavras de um entrevistado.

Já o “El País”, que criou uma seção em seu site apenas para “os protestos no Brasil” e deste terça-feira dá destaque ao tema em seu portal, hoje afirma que “a polícia perde o controle em São Paulo”. Na terça-feira, o jornal reportou, neste artigo de seu correspondente no Rio de Janeiro em versão impressa e online, como o “Brasil se levanta em protesto contra o aumento dos preços do transporte”, lembrando também manifestações em Natal e greve do setor em Florianópolis. E frisou a rejeição a elas por parte da classe média brasileira que, “pouco acostumada às manifestações de protesto nas ruas, está aplaudindo as autoridades”.

Mas essa rejeição parece estar diminuindo em questão de dias. Hoje, uma pesquisa do Datafolha revela que a maioria dos entrevistados na quinta-feira, 815 moradores de São Paulo com 16 anos ou mais, apoia os protestos, porcentagem que cresce entre os ouvidos com rendas mais altas, ainda que metade afirme não usar transporte público. Mesmo assim, quase a metade também acha que a ação da polícia foi “violenta na medida certa”.

Por aqui, esse movimento foi similar. Os protestos foram ganhando apoio aos poucos, embora sempre com fortes reservas, principalmente quando terminam de forma violenta.

Uma possível explicação para isso é a de que o foco dos protestos na Espanha –a política de austeridade– também afeta, ainda que em menor escala, a classe média alta das grandes cidades. De alguma maneira, os manifestantes falam a língua de quase todos, assim como no Brasil há muita gente contrária aos protestos que também se diz insatisfeita com o aumento do custo de vida. Outra vez, na pesquisa do Datafolha de hoje, mais da metade dos entrevistados diz não usar transporte público, embora uma maioria apoia as manifestações.

Quando eclodiu nas praças e ruas de toda a Espanha, o movimento dos indignados foi criticado por propostas demasiado abstratas, como outra forma de governo global. Depois, avançou para lutas mais concretas e ligadas ao dia-a-dia do país, e daí se solidificou e, dois anos depois de seu surgimento, sobrevive ativamente, como contei neste post mês passado.

Embora por aqui o foco dos protestos sejam cortes de gastos sociais, o aumento no preço de passagens  também é tema recorrente de manifestações em Madri. O transporte público da capital, que até 2010 tinha uma das melhores relações custo-benefício de toda a Europa, está aos poucos perdendo qualidade e ganhando cifras mais caras.

Como já contei aqui, quando cheguei a Madri, em 2009, o bilhete simples para a zona A, a mais central, custava € 1, e o de dez viagens saía por € 7,40 euros. Por € 46, comprava-se o bilhete mensal, que dava acesso ilimitado ao metrô e ônibus da cidade durante o mês corrente. Hoje, eles custam, respectivamente, € 1,50, € 12 e € 51,30.

Ano passado, o movimento “Paremos o Metrô”, contra o aumento das tarifas, provocou a paralisação dos trens subterrâneos de Madri por uma hora, em plena hora do rush, em uma ação coordenada na qual várias pessoas apertaram, ao mesmo tempo, o alarme de emergência dos carros, provocando uma pane.

Como em São Paulo, esse tipo de protesto recebeu muitas críticas. Mas também, como no Brasil, os espanhóis, que até 2010 viviam um certo estado de paz social, e internamente se criticavam por trocar as manifestações pela praia e a boa comida mediterrânea, hoje defendem cada vez mais seus direitos nas ruas.

 

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Por protestos, UE enfrenta Espanha

Por Luisa Belchior
10/06/13 21:54

Não são poucos, nem pouco frequentes, os encontrões entre o atual governo espanhol e instâncias europeias. As principais batalhas têm sido quase todas relacionadas à legislação imobiliária.

Na semana passada, o Parlamento Europeu concedeu um prêmio à (PAH) Plataforma Afetados pela Hipoteca, um movimento social que surgiu para impedir ordens de despejo de quem deve ao banco prestações da casa financiada na época do boom imobiliário e do crédito fácil.

Atualmente, a PAH se tornou um dos principais, se não o principal, atores da mobilização social que eclodiu na Espanha desde 2010. E também um dos principais “inimigos” sociais do atual governo, que com frequência acusa o movimento de atos ilegais e já o comparou com o grupo terrorista ETA.

Mas foi com a pressão da PAH que um dos primeiros casos de despejo foi parar no Tribunal Europeu, que acabou dando razão ao despejado e forçando o governo espanhol a anunciar, na mesma semana, mudanças na legislação imobiliária.

Hoje, a ex-presidente de Madri, Esperanza Aguirre, nome de peso no PP (Partido Popular), do premiê Mariano Rajoy, criticou a decisão de Bruxelas de premiar a PAH. Ela se disse “indignada” com a condecoração e acusou a UE de estar muito afastada dos cidadãos europeus.

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Na crise, baixe as pensões

Por Luisa Belchior
07/06/13 18:53

A recomendação do título não é minha, mas de um grupo de especialistas contratados pelo governo espanhol para traçar as diretrizes da reforma das pensões, a próxima na fila da política de austeridade do premiê Mariano Rajoy.

Hoje, a comissão apresentou o relatório encomendado pelo governo, com recomendações que deixaram pensionistas e sindicatos de cabelos em pé.

Isso porque o texto sugere baixar em até 19% as aposentadorias na Espanha nas próximas décadas, além de congelar o benefício em épocas de crise –com a que o país vive no momento– e de atrasá-lo para os futuros pensionistas.

E também acha que o governo deve mudar a forma de calcular os reajustes anuais da aposentadoria, atualmente feitos com base no IPC (Índice de Preços ao Consumidor) espanhol. A nova fórmula deve levar em consideração também os gastos e entradas do sistema de seguridade social, a inflação, a esperança de vida e a situação econômica do país no ano em que for feito o cálculo.

O que quer dizer que, em momentos de crise econômica, o governo poderá congelar as aposentadorias, um dos pontos mais criticados hoje por aqui.

Para os futuros aposentados, o prognóstico piora: a determinação da idade mínima de aposentadoria e o seu valor devem ser calculada de acordo com a esperança de vida na época, que segundo o relatório vem aumentando na Espanha. Ou seja: pensões mais baixas e mais tarde.

Os especialistas propõem ainda aplicar todas essas mudanças já a partir de 2014, 18 anos antes do que se planejava.

Esse documento é hoje apenas uma sugestão, mas será a base do governo para fazer as mudanças na atual legislação sobre o tema, e por isso despertou críticas por aqui. Isso porque a reforma das pensões é uma das mais espinhosas do governo, e a próxima da sua fila.

Piora o quadro o fato de que a Espanha é um dos países da União Europeia que menos gastam com as pensões, que cada vez mais sustentam famílias inteiras de desempregados desde o começo da crise econômica do país.

Hoje, já se comentou por aqui que, depois dos jovens, o próximo êxodo espanhol será o dos idosos.

 

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